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DOR SOCIAL – A dor que não para de doer.

A dor que não para de doer.

É comum referir-se a um sentimento de perda utilizando uma linguagem que se refere à dor física. Quem nunca descreveu a saudade como um aperto no peito ou o desprezo como facada no coração?

O que não se sabia é que as áreas do cérebro que são estimuladas durante a dor física, são as mesmas que são ativadas depois de vivências sentimentalmente negativas. Estudo recente feito por pesquisadores da Universidade de Michigan nos Estados Unidos demonstram esse paralelo.

Mas, enquanto a dor no corpo pode ser amenizada com medicamentos, o mesmo não acontece com a dor que ocorre na alma cujo sofrimento não cede nunca e contra a qual não existe nenhuma medicação. Solidão, rejeição, exclusão e bullying, entre outras, compõem o quadro daquilo se entende como dor social.

A dor social atinge cada vez mais pessoas nas regiões urbanas e é tão preocupante que a SBED (Sociedade Brasileira para Estudo da Dor) vai lançar uma campanha no segundo semestre para ajudar os pacientes a encontrar a melhor maneira de enfrentá-la.

Tão importante quanto esclarecer e orientar os que sentem a dor social é conscientizar os que estão na outra extremidade do problema e não sabem que são os seus causadores. Quando praticamos atitudes de intolerância em relação àqueles que são diferentes, provocamos neles a dor social através do preconceito.

O preconceito surge quando consideramos que uma pessoa tem menos valor por ser diferente do modelo que julgamos ser o normal, de acordo com nossos valores. A diferença pode ser de raça, de classe social, de orientação sexual ou de credo religioso.

Em geral, a pessoa que tem, não sabe disso, pois está no inconsciente e ninguém quer assumir. Normalmente usamos um mecanismo de defesa chamado de racionalização, ou seja, criamos uma razão que explica as nossas atitudes intolerantes. “Não tenho nada contra, apenas não gosto” é uma das expressões usadas para encobrir a culpa de quem o pratica.

Era estrangeiro e me acolhestes, são palavras de Jesus. Lembrem-se delas da próxima vez que se deparar com um morador de rua, um toxicodependente ou um marginalizado por qualquer outro motivo. Eles são seres humanos e a sua indiferença os faz sentir a dor social e isso dói muito.

Romildo R.Almeida – Psicólogo clínico

ACEITAÇÃO OU RESIGNAÇÃO – O que fazer quando o sofrimento é maior do que nós mesmos!

O que fazer quando o sofrimento é maior do que nós mesmos!

O ser humano não foi feito para sofrer, pelo menos de acordo com as nossas bases instintivas. Quando somos expostos a situações que envolvem dor, a tendência natural é reagir com inconformismo e indignação e o pensamento que prevalece dentro de nós é: Não quero isso pra mim.

O fato de não aceitarmos um determinado acontecimento, nos lança numa cadeia de sentimentos e emoções que se combinam e se multiplicam e isso só faz piorar as coisas. É dentro desse contexto que começa a depressão e, por conseguinte, uma série de outros problemas ligados a ela.

A Psicologia nos coloca diante de uma questão interessante quando se trata de lidar com a dor seja em relação a uma doença física ou a um acontecimento que nos perturba como o rompimento de uma relação afetiva. O que fazer? Aceitar ou resignar-se.

Essas são as duas posturas que podemos ter diante das perdas que nos afligem. A princípio, parece que querem dizer a mesma coisa, mas na verdade há uma grande diferença entre elas.

Aceitar uma situação difícil significa parar de gastar energia com culpa e autorrecriminações e ao invés disso, focar a atenção naquilo que podemos fazer de forma concreta para conviver melhor com a dificuldade. Resignação, por outro lado, é entregar-se passivamente e desistir de lutar considerando-se incapaz de enfrentar o problema. Imaginemos uma pessoa que sofre de uma doença incurável. Aceitar o fato a coloca numa posição ativa diante da doença fazendo-a focar nas possibilidades que ainda tem, buscando viver o momento presente, valorizando as mínimas coisas que é capaz de fazer independentemente de suas limitações. No mesmo exemplo, a resignação faria dela uma pessoa apática e lamentosa em relação ao ocorrido.

Atrairia para si o olhar de pena por parte daqueles que a cercam.

Em outras palavras ela não aceita o destino, apenas se submete a ele de maneira passiva justificando com a frase: “fazer o que? Deus quis assim”.

A ciência tem demonstrado que a maior parte das doenças afeta muito mais a nossa mente do que nosso corpo e que o processo de cura conta com uma participação importante do psiquismo. Saber administrar os próprios pensamentos cultivando uma vida serena é condição básica para se obter uma vida melhor.

Portanto, levante a cabeça e siga em frente. Desenvolva atitudes de gentileza e acolhimento e autocompaixão. Afinal, se Deus te ama, você também tem que se amar. Aceite-se exatamente como você é.

Romildo R.Almeida – Psicólogo clínico

ESCUTANDO A VIDA

Este artigo trata sobre a minha própria experiência sobre Mindfulness, a meditação e os exercícios que numa certa época da minha vida me ajudaram a meditar.

Hoje em dia a linguagem está em contínua evolução e mudança. Cada palavra pode ter vários significados em relação à cultura e às situações existenciais de cada pessoa. Por isso, neste artigo, tentarei explicar também em nível de linguagem o que eu entendo pessoalmente quando falo de “escutar a vida”.

Comecemos com a palavra Mindfulness. Para mim esse conceito não é uma técnica para o bem estar geral ou uma prática oriental para uns poucos escolhidos, Mindfulness no meu entender é uma atitude, um estilo de vida muito importante, já que nos ajuda a apreciar e usufruir a nossa existência. Como diz Nhat Hanh, a consciência plena, Mindfulness é “a capacidade de estar consciente e desperto no presente”.

É a prática contínua de sentir a vida profundamente em cada momento. Essa atitude não requer que se vá a nenhum lugar diferente. Podemos praticar a consciência plena ali mesmo onde estivermos, a cada momento. Podemos continuar fazendo as mesmas coisas que fazemos sempre: andar, sentar-se, trabalhar, comer, falar, com a diferença de que as faremos sendo conscientes do que estamos fazendo. ¹

Uma técnica ou instrumento que pode nos ajudar a praticar a consciência plena é a meditação.

Qualquer pessoa pode meditar e usufruir de seus resultados. Em minha opinião é uma capacidade que todos possuímos em nosso interior porem, em muitas ocasiões está à espera de ser descoberta. Isto acontece porque ninguém nunca nos mostrou ou ensinou.

Quando falamos de meditação imediatamente nossa mente associa ao silêncio. Relacionar meditação e silêncio não está errado, porém não é a mesma palavra.

Faz alguns anos eu consegui entender o que verdadeiramente significa o silêncio.
Em 2012 estive durante várias semanas em Ladakh, no Tibete da Índia.

Tive a oportunidade de consultar com diversos monges o que para eles significava o silêncio. Concretamente um, me afirmou que para ele o silencio era “escutar”, escutar nosso mundo interior para entender toda nossa vida e o que com ela está relacionado.

Em minha opinião, o ser humano é um ser completo, já que, conta com três dimensões que o abrangem por inteiro. Uma dimensão corpórea, uma dimensão racional e uma dimensão que eu chamo de espiritual e que se refere a tudo o que faz parte do nosso mundo interior mais profundo e que se manifesta através da nossa capacidade de transcender.

Cada dimensão produz necessidades que tem que ser escutadas para poder viver de forma equilibrada.

Cuidamos da dimensão corpórea com uma alimentação saudável, a prática de esportes, e a atenção a tudo o que diz respeito à parte física.

Cuidamos da dimensão racional com o sono, a leitura e relacionamentos saudáveis.

Cuidamos da dimensão espiritual parando e entrando em nosso mundo interior.

A meditação é um modo de colocar tudo isso em prática.

Através do silêncio, é possível ouvir todas as emoções e sensações que a nossa dimensão corpórea e relacional envia à nossa dimensão mais íntima.

Do mesmo modo, para mim, o silêncio é o modo que o ser humano tem de dialogar consigo mesmo.

Não existe verdadeiro diálogo se não houver capacidade de escutar².

Escutar não é o simples ouvir.

Atualmente estamos em uma época onde há muita dificuldade para a escuta. Estamos num momento onde as sensações rápidas e as imagens ganham. Eu mesmo sinto nos meus relacionamentos normais como há uma grande dificuldade na vida diária de escutar e de se escutar. Existe “barulho” externo demais e como conseqüência, “barulho” interno para nós.

Por tudo isto, uma das dificuldades que as pessoas podem ter hoje em dia em relação ao seu mundo interior, é fruto desta dificuldade em escutar. Colocando um exemplo para melhor entendimento desta questão, seria como querer colher os frutos de uma horta sem antes preparar e trabalhar bem a terra.

Quantas pessoas não se sentem bem consigo mesmas porque não se conhecem e não falam com o seu mundo interior! Não podem falar porque não sabem escutar.

É importante ensinar as pessoas a escutar a vida e a escutar a si mesmas.

Aprendendo a escutar tudo o que nossas dimensões pessoais nos dizem, podemos entender e perceber o que é de fato nossa vida e assim, viver a realidade como ela é.

Mindfulness, concluo, é saber escutar a vida, minha vida e a vida que me cerca, para poder estar desperto no presente.

Lucio Saggioro

Tradutora Carmen Lastiri Huarriz
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¹Cfr.www.tnhspain.org. Sobre a mensagem de Nhat Hanh.
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² Na Bíblia, a palavra “escuta” aparece 105 vezes

IKIGAI: Mindfulness e Sentido da Vida.

Ikigai é uma palavra japonesa que se tornou popular depois que o povoado de Okinawa, uma ilha do arquipélago japonês, foi objeto de estudo por parte de muitos investigadores. A atração que Okinawa produz entre os estudiosos vem não só do fato de que as pessoas que ali vivem são as mais longevas do mundo, mas também em como elas chegam à velhice; de forma muito enérgica e feliz.

Entrando em contato com essas pessoas os investigadores descobriram que o segredo da população de Okinawa é o IKIGAI. Eles afirmam que para ter uma vida longa e feliz é importante que cada pessoa encontre e cultive o seu próprio Ikigai.

Ikigai é uma palavra composta; IKI que pode ser traduzido com o verbo “viver” e GAI que pode ser traduzido com o substantivo “finalidade” ou “sentido”. Então, uma primeira tradução poderia ser “a finalidade da vida” (o objetivo da vida) ou “o sentido da vida”. Sendo um conceito muito complexo IKIGAI pode também significar: “a motivação que dirige a minha vida”, “o que preenche a minha existência”. “sentir-se vivo”, “realizar-se na vida”, “viver em plenitude”.

Os habitantes de Okinawa dedicam a vida trabalhando o IKIGAI e a boa notícia é que cada pessoa tem o seu próprio IKIGAI, sendo de vital importância achá-lo.

O que se pode observar é que não só a população de Okinawa se pergunta sobre o sentido da vida. Cada um de nós pelo menos uma vez na vida se fez umas perguntas existenciais. A produção filosófica desde a antiguidade até os dias de hoje reflete sobre qual é o propósito da vida. A maioria de nós concorda em que, quando nos referimos ao sentido da vida é um tema relacionado com o mundo interior. Mundo interior que eu pessoalmente denomino “dimensão espiritual”.

Cada vez estou mais convencido de que a dimensão espiritual é uma necessidade básica do ser humano e assim como outras necessidades básicas precisa um cuidado específico. Há múltiplas teorias sobre as necessidades humanas vindas da antropologia e da psicologia.

Diversas teorias do campo psicológico e antropológico desenvolvem e tentam ordenar as necessidades humanas; fala-se de necessidades primárias e secundárias, conscientes e inconscientes, voluntárias e involuntárias.

A neurociência explica que nosso cérebro desde sua origem buscava satisfazer três necessidades básicas: necessidade de segurança, necessidade de gratificação e necessidade de socialização. O cérebro do ser humano em 2.000.000 de anos triplicou sua dimensão (no sentido de tamanho) então isso produziu mais “trabalho mental”, o ser humano se desenvolveu mais como ser social (em maior ou menor grau). Igualmente, o fato de satisfazer essas necessidades básicas também se tornou mais complexo; já não interessa somente a “que” necessidades concretas satisfazer, mas a procura do “como” e do “porque” disso.

Um dos postulados mais famosos sobre a hierarquia das necessidades é obra do psicólogo estadunidense Abraham Maslow. Maslow afirma que a palavra necessidade indica “alguma coisa que falta”. Essa alguma coisa que falta não pode somente ser satisfeita para manter a vida, mas que também é um incentivo para buscar na vida algo mais além da simples sobrevivência. As necessidades de acordo com este autor estão estritamente relacionadas com as motivações.

O psicólogo estadunidense (Maslow, 1954) se refere a cinco tipos de necessidades:

1. Necessidades fisiológicas.
2. Necessidades de segurança e proteção.
3. Necessidades de filiação.
4. Necessidades de reconhecimento.
5. Necessidades de autorrealização.

Pessoalmente entre as necessidades de reconhecimento e as necessidades de autorrealização eu incluiria a necessidade de transcendência, que é este impulso do ser humano em direção à busca do sentido do que ele é, do que ele vive.

Então, a necessidade de transcendência é a força que nos impulsiona a buscar respostas às perguntas que surgem em nossa vida.

A necessidade de transcendência é a força que produz nos grupos sociais as experiências religiosas, as reflexões filosóficas, as buscas antropológicas.

Esta necessidade de transcendência eu chamo de “dimensão espiritual” e precisa um cuidado e um desenvolvimento adequado. No âmbito acadêmico já há tempo que se diferencia a inteligência espiritual e a inteligência emocional (Saggioro, 2014).

Desenvolver a dimensão espiritual é o cuidado com nosso mundo interior, lugar onde tudo o que vivenciamos ganha sentido.

Aqui é onde encontro no Mindfulness uma luz na escuridão.

Desenvolver a Atenção Plena nos permite entender melhor a própria vida. É uma capacidade de todas as pessoas e que todas as pessoas podem atingir. Uma capacidade que nos colocando em relação mais atenta com a vida, permite que possamos desenvolver a dimensão espiritual ou nosso mundo interior de forma mais eficiente. Eis porque consideramos que a atitude Mindfulness pode se relacionar com a espiritualidade; a prática da Atenção Plena favorece o desenvolvimento de aspectos específicos de cada tradição espiritual. A Atenção Plena te conecta com teu mundo interior, que é o núcleo da dimensão espiritual.

Costumo lançar mão deste exemplo para explicar a relação entre Mindfulness e dimensão espiritual.

A vida é como uma horta, um caminho espiritual são as sementes que eu quero semear e cultivar, a Atenção Plena é uma das ferramentas que me permitem preparar a terra onde semear e cultivar as sementes escolhidas. Quanto melhor trabalhada a terra estiver, melhor crescerão e frutificarão as sementes.

A finalidade da horta é produzir o que se cultiva, as ferramentas nos ajudam a atingir o nosso objetivo.

O confronto entre experiências de vida ajuda a crescer no conhecimento sobre a vida, e, se todos aprendermos a viver com sentido criaremos um mundo com muito mais paz e harmonia. A vida sem saber o que somos ou o que fazemos nos coloca em uma situação de ignorância, e a história da humanidade nos mostra que a ignorância é a raiz de qualquer forma de “não vida”.

Buscar um sentido na vida, nosso Ikigai, nos permite evitar alimentar a ignorância.

Mindfulness nos ajuda a estar atentos à vida, a observar a vida, a escutar a vida; estar atentos, observar e escutar são três ações fundamentais num processo de busca de sentido.

A contínua busca do “sentido” nos conduz ao encontro da paz interior, a uma realidade de harmonia íntima conosco mesmo apesar de tudo o que acontece nesta misteriosa aventura que se chama vida. A busca do sentido do que eu sou e do que eu faço sempre tem como fruto a paz interior. Podemos dizer que a paz interior é o que determina se a busca está correta ou errada. Por isso, até hoje dedico minha vida principalmente em buscar e dar cada dia um sentido profundo ao que sou e ao que faço. Mesmo que não tenho respostas para tudo o que vivencio cada dia, mesmo que não tenho fórmulas para solucionar qualquer dificuldade, penso que o sentido da vida é viver; melhor dizendo, o viver. E, observando a vida se pode entender a própria vida, é a vida que explica a vida.

“Cada um de nós percebe em seu coração o desejo de viver uma vida cheia de sentido. Este desejo é suficiente para fazer de nós uns investigadores e uns descobridores de sentido por toda a vida” (Elisabeth Lukas).

Lucio Francesco Saggioro

Tradutora Carmen Lastiri Huarriz

 

Referências:
– García-Campayo, J., Demarzo, M. Mindfulness. Curiosidad y aceptación. Zaragoza: Siglantana, 2015
– Lemke B. IKIGAI. Firenze: Giunti, 2017
– Hanson R. La forza della resilienza. Firenze: Giunti, 2018
– ¹ Cada vez estou mais convencido que o sentido da vida não é resolver problemas como erroneamente a cultura capitalista educa.