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O QUE A SÉRIE ADOLESCÊNCIA PODE NOS ENSINAR?

A série Adolescência em cartaz na Netflix, tem alcançado grande repercussão não só na mídia, mas também entre pais e educadores e pode ser um grande auxílio para ampliar o debate em torno da violência contra mulheres. A série é composta de quatro episódios e é centrada em torno de Jamie, um garoto de 13 anos acusado de assassinar uma adolescente da escola em que estudavam. A história, apesar de ser uma ficção, foi inspirada em vários casos que acontecem em todo mundo.

O personagem principal, está fora dos padrões que estamos acostumados a ver quando o tema é violência. Nada de garotos de periferia, filhos de pais separados, ou drogas. Ao contrário, é um adolescente de classe média que recebeu carinho e atenção dos pais, porém com um detalhe: os envolvidos, frequentam comunidades virtuais da internet que difundem informações misóginas, isto é, de ódio contra as mulheres integrando o que se chama de machosfera, (comunidades masculinas que se opõe ao feminismo). Esses jovens pertencem ao grupo “Incel” que significa involuntary celibates e em tradução para o português refere-se à celibatários involuntários.

Os membros do Incel, acreditam que são rejeitados pela maioria das mulheres e por esse motivo, não conseguem se relacionar afetiva ou sexualmente. Eles citam a regra 80/20 que explica que 80% das mulheres só se interessam por 20% dos homens e que por culpa delas, estariam forçados a ser celibatários. Na visão deles, essa ideia dá justificativa para a prática de violência contra as mulheres (Actum Samtum) e aqueles que a praticam não são criminosos e sim heróis. Muitos crimes contra mulheres e até massacres em escolas, são gerados a partir de fóruns de discussão nessas comunidades virtuais.

A série surpreende ao mostrar um universo totalmente desconhecido pelos adultos sejam pais ou educadores. Cercar os filhos de amor e carinho, suprir a maioria de suas necessidades materiais, pode não ser o bastante, pois atualmente as mídias sociais têm um grande poder na formação do caráter e na construção de valores. Influenciadores com milhões de seguidores “falam” com os adolescentes na privacidade dos seus quartos e ditam maneiras de agir e de pensar, enquanto os pais acham que os seus filhos estão seguros, dormindo abraçados com um ursinho de pelúcia.

Os adolescentes, tentam se inserir nos grupos sociais, mas nem sempre são aceitos. A necessidade de pertencimento aliada ao bullying que sofrem, são o pano de fundo para que busquem no mundo virtual, o apoio e a aceitação que não encontram na vida real. Temos que entender essa realidade; uma criança não pode ter acesso a esse mundo perigoso representado pela cultura Incel. As redes sociais carecem de regularização urgente, pois parte delas propagam o ódio e a destruição. A principal matéria que deveria ser ensinada aos adolescentes e praticada por todos chama-se empatia. Só ela nos conecta, verdadeiramente com o outro e constrói a única rede que a sociedade necessita, a rede do amor.

Romildo R Almeida – Psicólogo clínico

AQUECIMENTO GLOBAL E SAÚDE MENTAL – O planeta está com febre, mas os doentes somos nós!

A Campanha da fraternidade deste ano cujo tema é Fraternidade e ecologia integral, nos convida a refletir sobre um problema que afeta a todos independente da sua posição ideológica. As mudanças climáticas, já são visíveis na forma de deslizamentos de terra, enchentes, seca, incêndios florestais, etc. Em meio a esses fenômenos, um problema tem gerado preocupações e já se torna também visível. Estamos falando da saúde mental das pessoas envolvidas com essas mudanças. Pessoas que habitam locais vulneráveis a eventos climáticos, são inseguras, vivem em constante estresse, condições propícias para desenvolverem problemas de depressão e ansiedade.

Muitas pessoas buscam atendimento psicológico, depois de ter a casa invadida pela enchente e perder todos os bens. Essas pessoas podem desenvolver um quadro chamado de Transtorno de Estresse Pós-traumático. Os sintomas típicos incluem a revivescência repetida do evento traumático, sob a forma de lembranças invasivas (“flashbacks”), de sonhos ou de pesadelos. Fora isso, o transtorno gera um retraimento social, ou seja, a vítima evita contatos, perde o interesse pela vida, pois na sua mente existe sempre a ameaça de que tudo vai acontecer novamente.

As ondas de calor que ultimamente têm assolado o país de norte a sul, trazem consequências danosas a todos, mas crianças que estudam em escolas públicas têm sofrido muito mais com altas temperaturas no interior das salas de aula, que chegam a atingir 40 graus. Se essas temperaturas combinadas com a alta umidade já são inviáveis para o funcionamento do organismo, o que dirá para o aprendizado? Sem dúvida, as crianças pobres são as principais vítimas e certamente sua formação ficará comprometida, diferentemente das escolas particulares que contam com ar condicionado.

O Papa Francisco encontra-se internado em um hospital em Roma, lutando bravamente pela vida. É oportuno lembrar as suas palavras proferidas em 30/08 de 2024 a respeito do aquecimento global: “Se medirmos a temperatura do planeta, isso nos dirá que ele está com febre, que ele está doente. Precisamos nos comprometer com a proteção da natureza, mudando nossos hábitos pessoais e comunitários”. Há um consenso por parte da ciência de que a vida do planeta está ameaçada e que se algo não for feito agora, não haverá futuro para as próximas gerações. Certos governantes, porém, preferem julgar essa questão por um prisma ideológico. Não importa se você é católico, protestante ou ateu, se é de direita ou esquerda, capitalista ou comunista, o planeta está com febre, mas os doentes somos nós.  

Romildo R. AlmeidaPsicólogo clínico

A SAÚDE MENTAL ESTÁ EM JOGO – O vício em apostas é um transtorno psicológico perigoso

Os cassinos foram proibidos no Brasil em 1946 por iniciativa do general Eurico Gaspar Dutra, na época, presidente da República. A proibição tinha como objetivo, proteger a “tradição moral jurídica e religiosa” e contra os “abusos nocivos à moral e aos bons costumes”. A publicação do decreto lei, n⁰ 9.215 de 30 de abril de 1946, acabou com a chamada farra do ouro em que, nos salões lotados de pessoas da alta sociedade, se gastavam fortunas em jogos de roleta e cartas de baralho, regados a bebidas caras e charutos importados.

Se o objetivo da referida lei era proteger a população brasileira dos males produzidos pelo vício em jogos de azar, temos que admitir que ela só protegeria as camadas mais abastadas da população que tinham condições de se locomover até os grandes cassinos. No entanto, a lei não protegeu, os pobres em relação aos jogos de apostas promovidos pelo próprio governo como: Mega-sena, Lotofácil, Lotomania, etc. As “Bets online”, jogo do tigrinho, somados às outras modalidades de apostas, tornaram-se um grande perigo para a saúde mental, dada a facilidade em apostar pela internet.  Todos esses fatores somados, podem resultar numa patologia chamada de transtorno de jogos.

O que leva as pessoas ao vício é o sistema de recompensa do cérebro que libera uma substância chamada dopamina produzindo sensações de prazer. O indivíduo nessa condição passa a gastar compulsivamente acreditando que em algum momento vai atingir a sorte grande e se tornar rico. Aqui, existe um componente psicossocial importante, a maioria dos apostadores são pobres, sem expectativa de melhorar de vida através do trabalho e do esforço pessoa, para essas pessoas, os jogos são a única chance.

Estamos vivendo a Campanha do “Setembro amarelo” que trata da prevenção ao suicídio, portanto, momento oportuno para refletir sobre esse grave problema. Muitas pessoas têm perdido emprego, dinheiro, família e até praticado suicídio por causa do Transtorno de jogos. Desde 2018, a OMS – Organização Mundial da Saúde, considera esse vício como doença. Se você conhece alguém que esteja envolvido com apostas online alerte-o sobre os riscos, pois essa atividade aparentemente recreativa, pode se tornar um vício perigoso. A verdade é que quanto mais o indivíduo acredita na sorte, menos acredita em si mesmo. Por fim, a melhor aposta que podemos fazer é na busca pela serenidade e pela paz interior. De posse delas, não precisaremos de mais nada, pois já teremos o essencial para construir a verdadeira felicidade.

Romildo R.  AlmeidaPsicólogo clínico

O INIMIGO ESTÁ DE VOLTA – O perigo representado pelos Vapes

Quem observa as fotos impressas nas embalagens de cigarro, fica chocado: peles necrosadas, doenças terminais, sofrimento. Essas advertências começaram a ser feitas pelo Ministério da Saúde em 2002 a partir de recomendação da OMS. A campanha surtiu efeito, já que houve queda no número de fumantes e a indústria do tabaco sofreu grandes perdas, sobretudo com as multas milionárias que teve que pagar por ter induzido milhares de pessoas a fumarem. Na década de 70 era comum ver propagandas na TV associando consumo de cigarro a sucesso, força e beleza; hoje isso é proibido.

No entanto, o inimigo está de volta revestido de nova embalagem seduzindo jovens e adolescentes. Trata-se dos cigarros eletrônicos conhecidos como “Vapes”. O vape é um dispositivo alimentado por bateria que aquece os líquidos interiores contendo nicotina, aromatizantes e outras substâncias prejudiciais à saúde. Os vapes podem ser comprados em lojas físicas ou adquiridos pela internet. A popularidade desse produto decorre da falsa ideia de que ele não faz mal, que é apenas fumaça com gostinho de frutas e de que não tem nicotina. Muitos fumantes deixaram o cigarro e passaram a fumar esses eletrônicos acreditando estarem mais seguros.

Ao contrário do que se imagina, os vapes provocam níveis de intoxicação, no organismo superiores aos do cigarro convencional. Foi o que mostrou a pesquisa da Secretaria de Estado da Saúde de São Paulo em parceria com o Incor e a FMUSP. A análise toxicológica realizada em 200 fumantes de cigarros eletrônicos, detectou níveis de nicotina de três a seis vezes maiores do que os encontrados em usuários de cigarros convencionais. Outro problema é a dependência que o consumo de vape produz. Uma vez estabelecida, é extremamente difícil largar, devido a sensação de satisfação que ele produz no cérebro, através da dopamina.

Por que as pessoas consomem substâncias nocivas? Talvez pela curiosidade aliada ao desconhecimento dos seus malefícios, mas também pela necessidade de desafiar os perigos na busca de autonomia e liberdade. É como se tivessem a necessidade de fazer algo contrário à cartilha recomendada pela Família, pelo Estado ou pela Igreja. Vapes, narguilé e álcool são drogas que oferecem, a curto prazo, satisfação e prazer, mas com o passar do tempo, causam dependência. Faltam campanhas de conscientização a respeito dos perigos presentes nas drogas lícitas ou ilícitas. Falta entender, também que o usuário precisa de acolhimento e, em alguns casos, de tratamento psicológico, não de repressão. Por fim, falta saber que tudo que nos afasta da consciência, não é bom, pois o grande “barato” é estar plenamente consciente e celebrar a vida naturalmente.

 Romildo R.Almeida

Psicólogo clínico

TRAGÉDIA CLIMÁTICA NO SUL – O país se une, através da Compaixão, para ajudar o próximo.

As cenas tristes mostradas sobre a tragédia do Rio Grande do Sul, custam sair da nossa cabeça. Pessoas desesperadas depois de perderem tudo, cidades ilhadas, famílias desoladas vivendo em abrigo provisório e até animais domésticos isolados nos telhados. Se essas imagens causam comoção em quem as assiste pela TV, imaginem o que elas podem causar na mente de quem está lá, vivendo o desfecho como vítimas da catástrofe. Mesmo com o fim das cheias dos rios e a limpeza das casas, pessoas tentam voltar à vida normal, mas se deparam com outro problema: as “cheias mentais” provocadas pela tragédia que não saem da memória. A simples lembrança provoca a revivência dos acontecimentos, num fenômeno conhecido como TEPT – Transtorno do Estresse pós-traumático.

Os eventos mais propensos a causar esse transtorno, são aqueles que invocam sentimentos de medo, desamparo ou horror. Os principais sintomas incluem a revivescência repetida do evento traumático sob a forma de lembranças invasivas (“flashbacks”). Por muito tempo, as vítimas, têm pesadelos envolvendo os acontecimentos e passam a ter dificuldades para dormir devido as crises de ansiedade. A atividade social também fica comprometida pois o indivíduo acometido desse transtorno perde o encantamento pela vida e se afasta dos amigos. Até mesmo a libido é afetada dificultando relacionamentos afetivos e sexuais. São louváveis as iniciativas em todo o país para ajudar as vítimas no aspecto da reconstrução das perdas materiais, mas a reconstrução da pessoa traumatizada, também é uma etapa necessária.

Algumas pessoas com TEPT, necessitam de tratamento psiquiátrico e Psicoterapia Cognitiva para ajudar na reconstrução do bem-estar emocional e promover a resiliência necessária na superação dos desafios. Certamente, existe um turbilhão de emoções e sentimentos represados na mente de quem passou por situações desse tipo, que precisam ser expressados e validados, principalmente nas crianças. Às vezes, na ânsia de querer ajudar, passamos a dar conselhos e a narrar nossas experiências pessoais de superação, na tentativa de encorajar o outro. Mas, temos que resistir a essa tendência automática, pois o papel principal de quem fornece apoio emocional é o de oferecer-se ao outro através da compaixão acolhendo cada palavra, cada lágrima, cada gesto. Não se preocupe em dizer nada, apenas ouça, afinal o que faz uma pessoa sentir-se melhor, não são as palavras que você diz, mas o tipo de conexão que você estabelece com ela. Escutar com o coração também é uma atitude concreta de amor.

Romildo R. AlmeidaPsicólogo clínico

Páscoa e Ressignificação – Quando o velho dá lugar ao novo

Revendo a nossa história de vida, muitas vezes nos deparamos com experiências tristes que nos fazem pensar: Como seria bom se tivéssemos uma borracha que apagasse os nossos erros do passado, as lembranças dolorosas, os traumas e também nossas culpas. Teríamos a oportunidade de começar vida nova com um novo sentido, uma nova oportunidade. Infelizmente essa borracha não existe da maneira como imaginamos, mas a boa notícia é que podemos construir uma nova estrada, sem destruir aquela que já existia; podemos nos tornar pessoas novas e o nome dessa estrada é Ressignificação.

Ressignificar é mudar o significado dos acontecimentos através de uma postura compassiva e autocompassiva. Não é o mesmo que autoindulgência onde nos desculpamos pelos nossos erros com a tradicional atitude evasiva, representada pela frase: Errei, mas quem não erra. Ressignificar é compreender de forma profunda o nosso passado, avaliar as circunstâncias que envolveram, o nosso grau de consciência e, a partir disso, nossa vontade genuína de querer fazer diferente. A história de Saulo que passou de perseguidor de cristãos à homem piedoso e convertido, é um exemplo bíblico de tantas experiências que ocorrem em nosso meio.

Considerando a possibilidade da Ressignificação, ninguém está forçado a viver um destino manchado por um passado negativo e vergonhoso. Seja um dependente químico, um criminoso, um pervertido, etc. Não importa o quão errado você foi no passado, você pode se reconduzir à uma nova vida dando a si mesmo uma nova chance. Muitas vezes não é a sociedade que julga e sim, nós mesmos que através de uma postura crítica e pesada, condenamo-nos a viver dentro de um enredo trágico e negativo, acreditando na falsa ideia de que não podemos mudar.

            Este mês de abril em que celebramos a Páscoa de Jesus poderíamos buscar força e inspiração para começar esse trabalho, uma vez que Páscoa tem a ver com mudança, transformação e renascimento. Se ampliarmos esse significado e trazê-lo para a nossa realidade, podemos dizer que Páscoa é sair de um estado de prisão para alcançar a liberdade através da Ressignificação. Então, mais do que chocolates e bombons, que a sua Páscoa seja recheada de paz, harmonia, gratidão e compaixão. Celebre esse momento deixando que morra no seu coração o velho ligado ao passado e ao sofrimento para dar lugar ao novo, pois Páscoa é vida nova.

Romildo R.AlmeidaPsicólogo clínico

Mulher Invisível – A invisibilidade do trabalho de cuidado realizado pela mulher.

O tema da Redação do Enem de 2023 trouxe à luz uma realidade pouco discutida na sociedade, trata-se da invisibilidade do trabalho de cuidado exercido pelas mulheres no Brasil. Trabalho de cuidado é o conjunto de atividades físicas e emocionais, remuneradas ou não que garantem o bem-estar e a sustentação da vida, tais como: dar banho, alimentar, ensinar, assistir crianças ou idosos. Ao longo da história, esses trabalhos sempre estiveram relacionados ao gênero feminino. Até hoje, lavar e passar a roupa, manter a higiene da casa, preparar comida e zelar pela saúde da família, na maioria das vezes, são tarefas exercidas por mulheres. A noção de invisibilidade decorre do fato de que esses trabalhos não são reconhecidos formalmente.

Uma pesquisa feita pelo IPEA (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada) em 2023, apontou que o simples fato de ser mulher, acarreta um acréscimo de 11 horas semanais dedicadas exclusivamente aos trabalhos de cuidados que, logicamente, não são remunerados e nem entram na contagem por tempo de serviço. Outro lado da questão, é o trabalho doméstico remunerado formado pelas babás, mensalistas, diaristas, cozinheiras e cuidadoras cujo ambiente de trabalho é uma casa de família. A maioria é formada de mulheres pretas, que recebem não mais do que um salário mínimo e somente 25% possuem vínculo empregatício. Eis aqui, outro tipo de invisibilidade.

A perspectiva do futuro, não é muito animadora considerando uma sociedade que está envelhecendo e que, portanto, necessitará cada vez mais de cuidados pessoais. De acordo com a OIT (Organização Internacional do Trabalho) 2,3 bilhões de pessoas no mundo, vão precisar de cuidados diversos. Vemos, portanto, um grande campo se abrindo que precisa ser reconhecido, pois o que, antes era um privilégio de famílias abastadas, tornou-se uma necessidade, até mesmo, para famílias de baixa renda. No Brasil, a subvalorização dessa categoria de trabalhadores, em grande parte devido à falta de consciência a respeito de sua importância, trará consequências negativas.

Neste mês de março, mês em que comemoramos o Dia Internacional da Mulher, devemos aproveitar a oportunidade para apoiar a luta histórica das mulheres em busca de igualdade, no combate à violência de gênero que leva ao feminicídio e na criação de políticas públicas que garantam o seu bem-estar. Precisamos também combater o nosso próprio preconceito e discriminação, fruto da herança patriarcal que está no nosso inconsciente. Sem essa postura, as felicitações com mensagens bonitas, flores, chocolates, parabéns pelo seu dia, serão apenas atitudes vazias e sem sentido.   

Romildo R. Almeida – Psicólogo clínico

ACEITAÇÃO OU RESIGNAÇÃO – O que fazer quando o sofrimento é maior do que nós mesmos?

O ser humano não foi feito para sofrer, pelo menos de acordo com as nossas bases instintivas. Quando somos expostos a situações que envolvem dor, a tendência natural é reagir com inconformismo e indignação e o pensamento que prevalece dentro de nós é: Não quero isso pra mim.

O fato de não aceitarmos um determinado acontecimento, nos lança numa cadeia de sentimentos e emoções que se combinam e se multiplicam e isso só faz piorar as coisas. É dentro desse contexto que começa a depressão e, por conseguinte, uma série de outros problemas ligados a ela.

A Psicologia nos coloca diante de uma questão interessante quando se trata de lidar com a dor seja em relação a uma doença física ou a um acontecimento que nos perturba como o rompimento de uma relação afetiva. O que fazer? Aceitar ou resignar-se.

Essas são as duas posturas que podemos ter diante das perdas que nos afligem. A princípio, parece que querem dizer a mesma coisa, mas na verdade há uma grande diferença entre elas.

Aceitar uma situação difícil significa parar de gastar energia com culpa e autorrecriminações e ao invés disso, focar a atenção naquilo que podemos fazer de forma concreta para conviver melhor com a dificuldade. Resignação, por outro lado, é entregar-se passivamente e desistir de lutar considerando-se incapaz de enfrentar o problema. Imaginemos uma pessoa que sofre de uma doença incurável. Aceitar o fato a coloca numa posição ativa diante da doença fazendo-a focar nas possibilidades que ainda tem, buscando viver o momento presente, valorizando as mínimas coisas que é capaz de fazer independentemente de suas limitações. No mesmo exemplo, a resignação faria dela uma pessoa apática e lamentosa em relação ao ocorrido.

Atrairia para si o olhar de pena por parte daqueles que a cercam.

Em outras palavras ela não aceita o destino, apenas se submete a ele de maneira passiva justificando com a frase: “fazer o que? Deus quis assim”.

A ciência tem demonstrado que a maior parte das doenças afeta muito mais a nossa mente do que nosso corpo e que o processo de cura conta com uma participação importante do psiquismo. Saber administrar os próprios pensamentos cultivando uma vida serena é condição básica para se obter uma vida melhor.

Portanto, levante a cabeça e siga em frente. Desenvolva atitudes de gentileza e acolhimento e autocompaixão. Afinal, se Deus te ama, você também tem que se amar. Aceite-se exatamente como você é.

Romildo R.Almeida – Psicólogo clínico

RUMINAÇÃO MENTAL – A Depressão começa nos pensamentos distorcidos

O termo ruminar é normalmente utilizado para entender o processo de digestão de alguns animais como bois, camelos, girafas entre outros.

O processo de ruminação consiste em mastigar, engolir e depois retornar com o alimento à boca para ser remastigado e finalmente digerido.

Mas as ciências que se ocupam da saúde mental se apropriaram desse conceito para explicar um comportamento muito comum nas pessoas depressivas: Trata-se da Ruminação mental.

Estamos falando daquele pensamento negativo, que martela noite e dia. O problema da ruminação mental é que ela é a base da depressão.

Quando uma pessoa está em sofrimento emocional, é comum que tenha uma percepção distorcida da realidade e a depressão é realimentada por esses pensamentos formando um circulo vicioso.

A pessoa sente-se como se estivesse possuída de algum espírito maligno ou vítima de algum trabalho espiritual negativo.
Esses “espíritos” ruminam frases que destroem a nossa autoestima: “Sou um fraco”, “sou um perdedor”, “sou incompetente”.

Na verdade, são pensamentos automáticos gerados por crenças que desenvolvemos desde a infância. São ideias distorcidas baseadas em fases da nossa vida nas quais não tínhamos ainda uma mente capaz de discernir o falso do verdadeiro.

As experiências negativas tendem a solidificar esses pensamentos que mais tarde se tornam crenças centrais que compõem a nossa autoimagem.

Para não cair nas armadilhas mentais que nos aprisionam nessas crenças distorcidas, é preciso identificar os pensamentos automáticos.

Nem sempre pensamos o que queremos, pois os pensamentos têm vida própria, eles brotam na nossa mente sem a nossa permissão.

Quando conseguimos identificá-los, devemos adotar uma postura de acolhimento e aceitação, pois eles não são frutos da nossa reflexão consciente e inteligente.

Devemos tratá-los como nuvens no céu que se formam e se dissipam por si mesmas, independentemente das nossas ações.

Todavia, para muitas pessoas a autorreflexão não basta para identificar e lidar com a Ruminação. Nesse caso, é necessária a intervenção de um Psicólogo que através da abordagem Cognitivo Comportamental, poderá ajudar no entendimento e elaboração do problema.

As práticas de meditação de atenção plena mindfulness também são eficazes, uma vez que se contrapõem ao piloto automático, estado em que as Ruminações mentais acontecem.

Através dessas práticas podemos cultivar um estado de maior consciência do momento presente o que nos proporciona fazer melhores escolhas.

Não podemos ser escravos dos nossos pensamentos, afinal somos livres.

Pensamentos nada mais são, do que pensamentos.

POR QUE A GUERRA? A interessante pergunta que Einstein fez à Freud

Enquanto você lê esse artigo, milhares de pessoas estão morrendo em decorrência de guerras ou sofrendo as suas consequências. Desde 2525 a.C, quando aconteceu o primeiro conflito militar de que se tem notícia, a humanidade não parou mais de guerrear por diferentes motivos como: desentendimentos religiosos, interesses políticos, econômicos, rivalidades étnicas, etc. Além de causar mortes, as guerras provocam perdas econômicas, destruição do meio ambiente e traumas que ficam na mente dos sobreviventes.

Depois da guerra Franco-Prussiana, em 1871 que terminou com mais de 150 mil mortos, instaurou-se na Europa um movimento chamado de Belle Époque. De fato, era o sonho de uma bela época em que a humanidade viveria em paz, a partir dos avanços tecnológicos proporcionados pela Revolução Industrial. Os grandes pensadores ficaram tão otimistas que imaginavam que naquele mundo civilizado não haveria mais lugar para as guerras. No entanto, em 1914 eclodiu a primeira guerra mundial que deixou mais de 40 milhões de mortos e 30 anos mais tarde veio a segunda que matou mais de 55 milhões.

Em 1932 Albert Einstein escreveu uma carta à Sigmund Freud, criador da Psicanálise, com a seguinte pergunta: Por que a guerra? Existe alguma forma de livrar a humanidade dessa ameaça? A resposta de Freud foi desanimadora; segundo ele, existem dois instintos básicos na nossa psique: o instinto de vida ligado à preservação da mesma, chamado de Eros e o da Morte ligado a destruição, chamado de Thanatos. Esses dois princípios fundamentais se combinam e se completam de modo que um depende do outro. Por esse motivo, segundo Freud, a violência sempre acompanhará o homem no curso da sua história.

Considerando essa teoria, não devemos esperar que a paz aconteça, pois a humanidade carrega na sua constituição a semente da violência como estratégia de poder e dominação.  Violência contra seu semelhante, violência contra os animais, contra o meio ambiente e, em última análise, contra si mesmo. No entanto, não podemos viver de teorias. Precisamos acreditar na paz e construí-la de maneira simples a partir da nossa realidade. É preciso começá-la de algum lugar e o melhor lugar é dentro de nós mesmos. Precisamos ter paz interior para depois construir a paz exterior. Que a paz seja buscada, mesmo em meio a guerra, afinal, como disse o próprio Albert Einstein “Não se pode manter a paz pela força, mas sim pela concórdia. ”

POSITIVIDADE TÓXICA – A negação do sofrimento pode ser prejudicial à Saúde mental.

Todos devemos encarar a vida com otimismo e ter uma postura positiva frente às adversidades. Não há dúvidas de que a motivação é uma alternativa melhor do que o pessimismo em qualquer situação. Mas existe uma ideia que tem se difundido muito nos últimos tempos, principalmente nas mídias sociais. Trata-se da Positividade Tóxica que é o excesso de otimismo que as pessoas impõem a si mesmas no processo de condução de suas vidas. Evitar compulsivamente o contato com emoções negativas, disfarçar o sofrimento, forçar falsos sorrisos, podem ser, a longo prazo, atitudes prejudiciais à saúde mental.

A negação, conforme sustentava Sigmund Freud, é um mecanismo de defesa do ego e está relacionada ao propósito de fuga da realidade. A princípio parece bom, mas a longo prazo é prejudicial à saúde mental causando ansiedade, pânico e depressão. Por outro lado, a aceitação natural dos acontecimentos penosos, vivenciando todas as suas etapas, contribui para a sua superação, além de trazer amadurecimento e equilíbrio à personalidade. Não devemos confundir Positividade Tóxica com o otimismo que algumas pessoas têm. Enfrentar as adversidades com esperança, sem ignorar a realidade é bem diferente da postura do indivíduo com Positividade Tóxica.

A falta de empatia é, também, uma característica marcante da Positividade tóxica; o indivíduo preocupado consigo mesmo, não consegue colocar-se na perspectiva do outro, tornando-se, assim, egoísta. Quando alguém compartilha um sofrimento com um positivista tóxico, é comum ouvir, como resposta, frases evasivas tipo: isso não é nada, você é forte, etc. A tendência de querer positivar também é outra característica marcante do positivista tóxico. Por exemplo, quando alguém reclama do emprego, ouvir de volta algo como pelo menos você tem emprego. Isso promove desconexão além de não validar o sentimento do outro.

A ideia de que o agradável, o prazeroso, o motivador, devem estar acima das outras emoções consideradas negativas, gera egoísmo tanto no aspecto individual como no social. O distanciamento empático não contribui para um ideal de sociedade humana e fraterna, sobretudo nesses tempos difíceis pelo qual o mundo está passando. Desligar o rádio e a TV, fechar os olhos para as tragédias, não melhora o indivíduo e tampouco o mundo em que ele vive. Compartilhar a humanidade é aceitar que a dor do outro é, também, a minha dor. Nesse contexto, somos todos palestinos, judeus, russos e ucranianos, pois somos todos humanos. É melhor abrir os olhos para ver e o coração para sentir, pois o pior sofrimento é aquele em que fingimos estar felizes. 

PROCURA-SE UMA CRIANÇA – Uma breve discussão sobre a erotização da infância.

Outubro é o mês em que as atenções se voltam para as crianças. Essa época tornou-se importante, também, para o comércio, pois marca o início das vendas de Natal. Em meio as dúvidas naturais sobre o que comprar, surge uma questão mais importante: Do que elas estão precisando efetivamente? Uma breve olhada nos perfis, disponíveis nas mídias sociais, nota-se um fenômeno preocupante: As crianças estão deixando de ser crianças; estão se apresentando como se fossem adultos, buscando notoriedade e seguidores. Para atingir esse objetivo, usam recursos que as expõe perigosamente frente a um público ávido por conteúdos eróticos.

Muitas pessoas podem argumentar que, as crianças estão apenas se divertindo, que não há nada de errado, e que a maldade está nos olhos de quem vê. De fato, não teria problema algum se o vídeo fosse apenas para registro particular, mantido em casa. Mas a partir do momento em que eles se tornam públicos e com o aval dos próprios pais, qualquer pessoa pode copiá-los e utilizá-los como quiserem. É o que tem acontecido ultimamente, quando grupos criminosos alimentam sites de pornografia inserindo imagens de crianças que foram colhidas dos perfis exibidos na mídia social. Essa é a nova face da Pedofilia.

A criança ou até mesmo o adolescente, não possui maturidade suficiente para avaliar as consequências dos seus atos. Tudo o que querem é alcançar reconhecimento e obter poder através do aumento de seguidores e número de curtidas. O problema é que na ambição de ganhar popularidade, acabam reproduzindo o mesmo padrão hipersexualizado encontrado nas páginas dos adultos. Essa hipersexualização, infelizmente, está se tornando cada vez mais precoce e as consequências não são positivas. Podem causar estresse, ansiedade além de afetar o rendimento escolar. Contudo, o problema mais grave é a vulnerabilidade dessas crianças diante desse mundo virtual, tornando-as presas fáceis de pessoas mal-intencionadas.

Nesse mês de outubro que é o mês em que a sociedade coloca a criança como centro, é importante refletir sobre a nossa responsabilidade seja como genitores ou educadores. Temos um desafio que é resgatar a criança que foi atraída e presa nessa realidade virtual. É preciso devolver a elas o mundo concreto representado por brinquedos educativos que elas possam tocar e sentir. Existe uma variedade de jogos, filmes, livros que trabalham autoestima, meio ambiente, respeito ao próximo que podem ser opções na hora de presentear. Precisamos enxergar nos perfis de crianças e adolescentes expostos nas mídias sociais, as vozes abafadas e inocentes que, de maneira sutil, clamam pelo direito de ser apenas crianças.  

    Romildo R. Almeida – Psicólogo Clínico

MINDFULNES NA FAMÍLIA E COM A FAMÍLIA.

São muitas as propostas de atividades baseadas em Mindfulness dirigidas aos vários membros de uma unidade familiar: Programas de Mindfulness para pais, Programas de Mindfulness para avós, Programas de Mindfulness para crianças ou adolescentes. Deve-se notar, no entanto, que há poucas ofertas de treinamento em mindfulness para a família como um todo.

Vamos ver em detalhes como as práticas de atenção plena podem beneficiar qualquer núcleo familiar.

Cultivar uma atitude de Mindfulness, estar presente no presente sem julgamentos, traz muitos benefícios a nível individual; isso é confirmado por muitos estudos nas áreas de biologia, medicina, neurociência, psiquiatria e psicologia. As práticas de mindfulness melhoram o estado de atenção, o conhecimento e a gestão das nossas emoções e consequentes ações e melhoram a visão global: em suma, tornam-nos mais conscientes do nosso ser no sentido individual e também do coletivo. Se cada pessoa de um núcleo familiar for mais consciente do seu ser e do seu estar em relação, claro que, por consequência, toda relação-conexão familiar será beneficiada. O bem-estar e a harmonia familiar são em grande parte determinados pela qualidade das relações entre os atores envolvidos. Pense em um carro que corre com os quatro pneus calibrados com a mesma pressão e pense, como seria, a corrida do mesmo carro com os quatro pneus calibrados com uma pressão diferente. Pior ainda se uma roda estiver furada, neste caso, o bom senso pede para parar e reparar a roda danificada. Cultivar uma atitude Mindfulness envolve uma maior consciência de sermos família; um conjunto de personalidades distintas com singularidades próprias que partilham valores, espaços e tempos. Uma família que cultiva uma atitude de Mindfulness notará isso sobretudo a nível comunicativo; a comunicação será mais empática, sincera e assertiva.

Algumas propostas práticas para fazer crescer e cultivar as competências de Mindfulness em família e na familia. Por exemplo, a prática da respiração consciente: cada membro da família aprende uma prática respiratória relacionada à sua idade e depois, durante a semana, pratica uma técnica de respiração consciente todos juntos em família. Uma prática informal, que ajuda muito a cultivar uma atitude de Mindfulness na família, é planejar o número de refeições que farão juntos durante a semana. Quando todos comem juntos, é importante desligar a televisão, o rádio e os celulares para desfrutarem de todas as nuances de estarem juntos a comer à mesma mesa.

As técnicas e ferramentas são inúmeras; é importante entender que ser família é um grande presente que a vida nos dá e seria realmente triste não saber disso.

Lucio Francesco Saggioro, traduzido do italiano por: Romildo R.Almeida

NARCISISMO PARENTAL – A tênue fronteira entre cuidar e prender

O drama vivido pela atriz global Larissa Manoela, amplamente explorado na mídia no último mês, é o ponto de partida para discutir um problema muito comum que ocorre nas famílias. Trata-se da relação de possessão que alguns pais querem exercer sobre os filhos. É natural que alguns pais tenham dificuldade em transferir responsabilidades e, até certo ponto, isso não é um problema. Na maioria das vezes, esse sentimento, logo dá lugar ao orgulho de presenciar o sucesso dos filhos. No entanto, existem casos em que essa relação é carregada de estresse, pois os genitores querem dirigir a vida dos filhos em todos os aspectos, sob a justificativa de que eles são jovens imaturos.

Alguns casos podem evoluir para o Narcisismo Parental, um transtorno psíquico que atua especificamente na relação entre pais e filhos. Narcisismo origina-se do mito grego onde o belo jovem Narciso se apaixonou pela própria imagem refletida nas águas do rio e, por esse motivo, viveu infeliz e sozinho, impossibilitado de se relacionar com outras pessoas. No Narcisismo Parental, o pai, a mãe ou ambos se seduzem pelo papel que representam e têm dificuldade de reconhecer a autonomia dos filhos, pois isto significaria abrir mão da própria superioridade pela qual, estão seduzidos.

 Na prática, não querem perder o poder que imaginam ter e, por isso, transformam a convivência numa relação tóxica e carregada de estresse envolvendo sentimentos contraditórios de amor, inveja, ciúme e até ódio. Pais narcisistas em geral, são autoritários, egoístas e manipuladores, pois, ao longo do relacionamento com os filhos, desenvolvem essas características como estratégias para manter o poder sobre eles. Quando são contestados ou desafiados, tornam-se agressivos fazendo com que a relação se torne inviável. As consequências não são boas para nenhuma das partes, pois os pais acabam sozinhos repetindo o mito de Narciso. Quanto aos filhos, os danos são ainda maiores, pois podem desenvolver: baixa autoestima, dependência afetiva, insegurança, depressão, entre outros.

Nunca a carta de São Paulo aos efésios (Ef 4:24) tornou-se tão apropriada ao contexto que estamos vivendo sobretudo nas relações sociais, incluindo as famílias.  Revestir-se da nova humanidade é desapegar-se dos valores materiais, do poder que queremos exercer sobre as pessoas e aprender a viver na humildade. A sedução nos cega tal como no mito de Narciso e nos faz viver aprisionados pelo egoísmo.  A empatia é a porta que se abre para o amor, permitindo viver a bondade de coração, único caminho que pode nos libertar e conduzir à felicidade sustentável e à Salvação.

    Romildo R. Almeida Psicólogo Clínico

A CAPACIDADE NEGATIVA

Tenho um amigo que é arqueólogo há anos e trabalha nas escavações da antiga cidade de Pompeia, na Itália. Ele me disse um dia, que o maior perigo para as descobertas antigas não é apenas o tempo ou a lava misturada com terra de pedra que destruiu a cidade há milhares de anos. O maior perigo para escavações ou qualquer coisa antiga são as minúsculas sementes de grama. Eu, que vivi muitos anos em lugares antigos, confirmo isso. As sementes transportadas pelo vento, escorregam para as minúsculas fendas existentes nas pedras, que formam paredes ou telhados e, quando encontram um pouco de terra e água, sem pressa, começam a germinar. Ao brotar, elas abrem espaço e aumentam a rachadura original para que mais água e quaisquer outras sementes possam se infiltrar nessa mesma nova rachadura. A força da vida não tem medo das condições desfavoráveis ​​de uma antiga muralha, abre caminho e cria uma nova vida.

Em 1817, o poeta romântico John Keats usou a expressão “capacidade negativa” para definir o que deveria ser a principal característica do Homem de Realizações. Ele a chamou de “negativa” para contrastá-la com a necessidade “positiva” que muitas vezes temos de intervir nos problemas que encontramos, aplicando imediatamente uma atitude baseada na solução rápida. Segundo Keats, esse pegar o touro pelos chifres, esse partir e encarar a situação que se apresenta, pensar imediatamente em uma forma de submeter a realidade à nossa vontade é, antes de tudo, uma forma de não pensar e fugir.

De fato, ele definiu habilidade negativa, como aquela habilidade que um homem possui se souber perseverar nas incertezas através de mistérios e dúvidas, sem se deixar levar por uma busca vagarosa de fatos e razões. A aplicação imediata de uma solução é, na maioria dos casos, o exato oposto da capacidade negativa: é, antes, uma resposta automática, através de uma forma que restabelece rapidamente o status quo, resolvendo a dissonância que um problema nos apresenta.

A capacidade negativa é parar na incerteza, ouvi-la e entender o que ela está nos ensinando. Às vezes é melhor passar um pouco mais de tempo observando, ouvindo e se acalmando, para depois encontrar a solução certa, do que agir rapidamente com base em modelos mentais pré-estabelecidos, que têm apenas um efeito analgésico. A capacidade negativa é agir com o coração, é não ser escravo das situações da vida, vai além da reação impulsiva.

Está amplamente demonstrado que as práticas de atenção plena, se realizadas regularmente, aumentam a capacidade do indivíduo de aceitar os fatos da vida como eles são. Aceitar a realidade significa ir além do dualismo “gosto-não gosto”, isso leva à observação sem julgamento dos próprios fatos.

A aceitação da realidade é a base e o alimento da capacidade negativa.

A paciência da semente da grama permite que ela cresça e abra espaço em lugares impensáveis. Ela tem fé na força vital dentro de si.

Capacidade negativa é confiar na força vital que existe em cada um de nós.

PAI MISÓGINO OU PAI FILÓGINO – O que você quer ser quando crescer?

Estamos em agosto, mês em que se comemora o dia dos pais, data propícia para refletir sobre a importância da paternidade na construção da família. Gostaria de fazer isso à luz do Anuário Brasileiro de Segurança Pública, divulgado recentemente e, de acordo com os dados, houve uma média de 205 estupros por dia no Brasil em 2022. Os números podem ser ainda maiores pois não incluem os casos em que a vítima não prestou queixa. Se compararmos com 2021, houve um aumento de 8,2%, o que coloca o Brasil no mapa dos países mais perigosos para mulheres.

O que isto tem a ver com paternidade? Bem, os meninos de hoje, serão os homens de amanhã, mas a questão é: que tipo de homens serão? A formação da personalidade de qualquer pessoa, depende, em grande parte, do modelo com o qual ela conviveu na infância desde o nascimento. A educação é um processo complexo que envolve interação com os pais em diversas situações, numa constante troca, que se dá, tanto no aspecto consciente, quanto no inconsciente. Por esse motivo, podemos supor que homens que praticam abuso e violência, não incorporaram um modelo positivo de masculinidade na infância e a causa disso pode estar na figura paterna.

A Misoginia que significa ódio ou aversão às mulheres, começa no machismo estrutural, impregnado de falsas ideias sobre masculinidade tais como: homem não chora, não sente dor, é imbrochável, etc. Em contrapartida, que mulher é frágil, carente e insegura. No aspecto sexual, o mito de que homem não pode fraquejar perante a mulher, e o preconceito de que a mulher provoca o homem dependendo da forma como se veste. Como vemos, é preciso mudar essa estrutura que está no inconsciente de cada homem, sem exceção. Os novos pais têm a missão de substituir o modelo machista, berço da Misoginia para um modelo que cultiva apreço, afeto e respeito pelo sexo feminino, chamado de Filoginia.

O pai deve estar no centro dessa mudança, interagindo em todas as situações e oferecendo-se como modelo positivo a ser seguido. É observando o respeito que os adultos têm pelas pessoas, que a criança absorve e constrói o seu caráter. Num tempo de guerra, de conflitos e de polarização, precisamos semear a paz e reconstruir a sociedade a partir de nós mesmos. Como disse o Papa Francisco: “É necessário esculpir a própria vocação em prol da humanidade e do bem comum. ” Seja um pai ativo na educação ensinando os seus filhos. Filoginia sim, Misoginia nunca.

FELICIDADE LÍQUIDA OU FELICIDADE SUSTENTÁVEL – Como as Redes Sociais afetam nossos projetos?

Não basta passar as férias num lugar maravilhoso se ninguém souber que você esteve lá. Essa é a lógica que faz com que as pessoas se exponham cada vez mais nas redes sociais. Mas a felicidade só é completa quando a quantidade de likes recebidos alcança a meta esperada pelo ego. Parece que desistimos de buscar a felicidade real baseada em motivos sustentáveis e estamos nos contentando com a felicidade líquida que só existe nos feeds do Instagram e desaparece em seguida.

Infodemia, é o nome que se dá ao excesso de informações que recebemos e compartilhamos diariamente na Internet. Uma pesquisa da Comscore mostrou que o brasileiro passa, em média 46 horas por mês conectado nas mídias sociais. O Brasil está na terceira posição entre as nações que mais consomem esses aplicativos, além de ser o segundo país com mais influenciadores digitais no mundo. Influencer já é a profissão que mais cresce no Brasil, superando em 8 vezes a profissão de Advogado e em 20 vezes, a de Médico.

O papel do Influenciador digital é atrair o interesse das pessoas através de suas habilidades de comunicação para promover produtos e marcas. O sucesso alcançado por esses profissionais ultrapassou os limites da profissão e hoje tornou-se um modelo de comunicação social.  A maioria das páginas de pessoas comuns, exibe a mesma estrutura encontrada nas páginas dos influencers com cenas de uma vida idealizada, que muitas vezes, é só aparência. Nas Redes Sociais não há lugar para dor, tristezas e derrotas; ninguém posta situações desafiadoras, só conquistas.

Para além do simples passatempo recreativo, ficar horas nas Redes Sociais consumindo e compartilhando informações, pode afetar a saúde mental. A ideia de que a minha grama não é tão verde quanto a do meu vizinho, faz todo sentido aqui, pois cria o pensamento de que “todos são felizes, menos eu”. Para a nossa mente inconsciente, que não diferencia o falso do verdadeiro, essa atitude mental ganha um caráter concreto transformando-se em descontentamento com a vida, ansiedade e depressão.

Devemos ter sonhos e lutar por eles, mas antes disso, é preciso aprender a gerenciar nossas emoções. Será que sou mesmo um fracassado? Os meus projetos de vida são, realmente meus ou estou me baseando na história dos outros? A felicidade compartilhada nas Redes Sociais é líquida e descartável enquanto que a felicidade sustentável começa com a aceitação incondicional de quem você é incluindo defeitos. Mas a vida não pode se fechar nos interesses individuais; é preciso se abrir para o próximo através da generosidade e da prática constante do bem. Quando você sentir a verdadeira felicidade presente no seu coração, não precisará mais postá-la em nenhuma Rede social.

 Romildo R. Almeida – Psicólogo Clínico

OS PERIGOS DA INTELIGÊNCIA ARTIFICIAL – Até aonde a tecnologia pode evoluir sem ferir nossa liberdade?

Em 1940, em plena segunda guerra mundial, o matemático britânico Alan Turing construiu uma máquina eletromecânica, que decifrou os códigos dos navios de guerra da Alemanha. Essa invenção não só ajudou os aliados a derrotarem os nazistas, como também criou as bases teóricas da computação que permitiram o surgimento da Inteligência Artificial “A.I”. Em novembro de 2022 foi criado o ChatGPT, uma ferramenta de pesquisa e produção de conteúdos que é derivada direto dessa inteligência e o seu uso está sendo muito discutido atualmente. Quais as consequências positivas ou negativas que o uso da A.I. provocará na sociedade?

Inteligência Artificial é o conjunto de ciências, teorias e técnicas que visa imitar as habilidades cognitivas de um ser humano. A Revolução Industrial, no início do século, facilitou a vida das pessoas, mas teve um alto custo representado pela degradação do meio ambiente e o surgimento de doenças. Desta vez, estamos vivendo uma nova revolução tecnológica que pode trazer mais eficiência na execução de tarefas, mas ao mesmo tempo, muitos perigos. Programas inteligentes como o ChatGPT, podem assumir o lugar das pessoas e influenciar decisões mudando o rumo da sociedade.

O ChatGPT seria capaz de elaborar artigos científicos e até de escrever livros. Nas artes, poderia compor peças teatrais, roteiros de filmes e músicas. Mas o maior perigo está no campo social: softwares inteligentes poderiam criar informações falsas e manipular imagens trazendo risco à privacidade dos indivíduos. A foto do Papa Francisco vestindo um casaco branco, publicada por inúmeros sites, é um exemplo claro desse perigo. Não é à toa que na Itália o ChatGPT está proibido e outros países da Europa estão criando leis para seu uso.

Por trás das questões éticas que envolvem o desenvolvimento de sistemas de inteligência artificial, está um mercado avaliado em centenas de bilhões de dólares. Curiosamente, os maiores líderes desse setor escreveram um documento com mais de 1000 assinaturas solicitando uma pausa de seis meses no desenvolvimento dessa nova tecnologia. O documento alerta para “riscos profundos para a sociedade e para a humanidade”.

Resumindo, se até os maiores interessados estão preocupados com as consequências dessa nova tecnologia, deveríamos nos preocupar mais ainda. Afinal, nenhum progresso vale a pena se perdermos a condição sagrada de sermos pessoas livres e conscientes, capazes de fazer nossas escolhas. Que a Inteligência Artificial, ainda que mais avançada, esteja sob o domínio da inteligência humana, para que possamos honrar e dignificar nossa humanidade.

               Romildo R. Almeida

      

Ataque às escolas no Brasil – A tecnologia une iguais, para o bem ou para o mal

É difícil colocar-se no lugar da professora de 71 anos, morta por um adolescente numa escola de São Paulo. É difícil também imaginar-se no lugar dos pais que perderam seus filhos na creche de Blumenau em Santa Catarina. Mas é fácil reduzir esses acontecimentos a simples falhas de segurança nas escolas. Fala-se em aumentar o número de policiais, instalar câmeras de vídeo e revistar alunos. Essas medidas são válidas, mas levam em conta apenas um lado da questão, pois a verdadeira causa do problema é complexa e tem a ver com a saúde mental das pessoas.

De acordo com as estatísticas, somente entre 2022 e 2023, o número de ataques em escolas no Brasil já supera o total registrado nos 20 anos anteriores. Qualquer projeto que tente estudar esse fenômeno, tem que considerar as influências que as redes sociais exercem no desenvolvimento da personalidade de um jovem ainda em formação. A verdade é que, para o bem ou para o mal, o acesso fácil à internet promove alterações na maneira de pensar e de agir das pessoas que fazem uso constante desse recurso. Os adolescentes e as crianças, pela sua vulnerabilidade, são os principais afetados.

A Internet facilitou a vida das pessoas, mas se tornou uma espécie de caldeirão no qual se misturam os mais variados personagens, por meio de afinidades e interesses. É nesse ambiente virtual que o ódio se articula e ganha corpo, manifestando-se em ações violentas contra pessoas ou instituições. Esse potencial destrutivo sempre existiu na história da humanidade, pois pertence ao inconsciente coletivo, mas faltava algo que fosse capaz de ativá-lo e ampliá-lo, fazendo-o saltar da imaginação para a realidade. Agora não falta mais, pois a internet preencheu essa lacuna. Infelizmente as interações sociais e afetivas estão sendo substituídas pelo ambiente virtual. As crianças, muito cedo, aprendem a navegar e tornam-se dependentes.

A discussão em torno da regulação das redes, encontra grande barreira representada pelo interesse de poderosos grupos econômicos que lucram alto com as atuais regras que regem a publicação de conteúdo. Resta uma saída chamada conscientização e ela tem que começar na família. Uma criança com menos de 12 anos não deve ter perfil na internet, Smartphones não são brinquedos e deveriam vir com um alerta: “Desaconselhável para crianças. ”  

Antes de permitir que uma criança navegue na rede, saiba que ela vai entrar num mundo onde céu e inferno estão muito próximos; e a porta que divide um do outro é de apenas um click, portanto, Cuidado!

 Romildo R. Almeida

Psicólogo clínico

PÁSCOA E FELICIDADE! – Você pode se transformar numa pessoa melhor!

Você é feliz? Se o motivo da sua felicidade está baseado no seu poder de compra, saiba que isso não é felicidade e sim conforto material. Os bens materiais perdem o efeito com o decorrer do tempo e têm que ser renovados constantemente gerando uma necessidade compulsiva de adquirir mais para tentar manter o nível de prazer. Mas, será que é possível ser feliz sem contar com recursos materiais? O monge budista Matthieu Ricard, foi considerado a pessoa mais feliz do mundo, de acordo com imagens do seu cérebro obtidas através de ressonância magnética. E o que ele faz para ser feliz? Nada, simplesmente medita práticas de compaixão e autocompaixão.

O estresse mata. A felicidade, do ponto de vista fisiológico, está ligada à ausência de estresse e essa condição pode ser detectada por intermédio da atividade de uma pequena glândula localizada no sistema límbico, chamada amígdala cerebral. Pessoas estressadas apresentam grande atividade nessa área do cérebro e maior probabilidade de desenvolver, entre outras doenças, diabetes, hipertensão, infarto e AVC. Herdamos o estresse do homem primitivo, que tinha que lidar com perigos extremos como caçar e defender-se de predadores. Hoje, os perigos são outros, mas o nível de estresse é o mesmo.

Entretanto, nos últimos anos, a ciência tem demonstrado o que as religiões sempre pregaram, ou seja, que a compaixão e a bondade vivenciadas de forma genuína, trazem um nível de felicidade sustentável que não se altera nem mesmo diante de condições adversas. A compaixão pelo próximo, altera a configuração do nosso cérebro, desenvolvendo um estado de calma e segurança. A boa notícia é que ela pode ser treinada e cultivada, portanto, você não precisa ser um monge para desfrutar de uma felicidade plena, basta cultivar atitudes bondade em relação a si mesmo e ao próximo.

A Páscoa traz um sentido profundo de libertação e transformação, oportunidade perfeita para rever a nossa relação com a vida e com o mundo que estamos construindo dentro e fora. Como lido com as minhas perdas, minhas frustrações e meus fracassos? Sou auto compassivo? E em relação aos outros, sou empático e pratico boas ações? As respostas negativas a essas perguntas estão ligadas ao estresse, caminho que nos leva à doença e à morte. Mas a compaixão e a autocompaixão representam vida nova e a oportunidade de ser feliz de verdade, porque a única riqueza que importa de fato é aquela que ninguém pode roubar: a sua paz e a sua liberdade. Isso é Páscoa!

Romildo R. Almeida – Psicólogo Clínico

NATAL E A DITADURA DA FELICIDADE – Será que todos são felizes, menos eu?

Ao ver as ruas enfeitadas com iluminação natalina, pessoas se confraternizando e nas mídias sociais todos se esbaldando de euforia, talvez muitos façam a pergunta do subtítulo deste artigo: “Será que todos são felizes, menos eu? ” De fato, para uma boa parte da população, o Natal é um momento nostálgico de tristeza, pois evidencia a ausência de pessoas queridas que estão distantes ou já não estão mais neste mundo. Comparando a felicidade encontrada nas redes sociais e a vida real, fica evidente o contraste.

Ditadura da felicidade é quando somos induzidos por pressão externa a expressar alegria em algumas ocasiões independentemente do estado interior. Ela se acentua nas festas de fim de ano principalmente para quem já sofre de depressão. A obrigatoriedade de ser feliz a qualquer custo, leva muitas pessoas a exceder no consumo de bebidas alcoólicas na tentativa de entrar no clima de alguma forma mesmo que seja de maneira falsa. Existem alguns mitos relacionados à ditadura da felicidade que precisam ser desfeitos.

É falsa a ideia de que a felicidade é um estado natural de todo ser humano. Esse pensamento só interessa às indústrias farmacêuticas que vendem antidepressivos. A frustração faz parte da vida independentemente da condição social. A internet está cheia de cursos e palestras que se propõem a ensinar o indivíduo a livrar-se dos pensamentos negativos para ter uma vida feliz.  Mas qualquer terapia que se baseie na exclusão ou eliminação de sentimentos é ineficaz, pois eles sempre retornam com força maior.

A boa notícia é que não precisamos eliminar da nossa mente aquilo que consideramos negativo. Acolha todas as experiências como se fossem novas, sem julgar, nem criticar. Não fique ruminando pensamentos sobre passado ou futuro. Ao invés disso, habite o seu próprio corpo percebendo a beleza que existe no simples ato de respirar, trazendo leveza e vivendo apenas o momento presente. Aprenda que a beleza do Natal não está nas luzes que enfeitam a cidade, mas na luz que te ilumina por dentro com abundância de paz e serenidade. É na simplicidade de uma criança nascida numa manjedoura que está o milagre que faz o Natal acontecer.

                                           Romildo R. AlmeidaPsicólogo clínico

O QUE VOCÊ QUER SER QUANDO ENVELHECER? – Da infância à velhice. As metamorfoses que marcam nossa vida

Existem quatro fases da nossa vida que impactam toda a nossa existência. A primeira delas é o nascimento que é marcado por uma mudança geral na família em todos os sentidos. Essa experiência, apesar de desafiadora, é vista como um momento feliz e vivida com grande intensidade. Em seguida vem a infância, uma fase colorida, pois tanto os pais como a própria criança vivem uma espécie de conto de fadas onde a fantasia ocorre de ambos os lados: os pais vivem a ideia de que seus filhos serão crianças para sempre e as crianças, vivem a fantasia de serem reis e rainhas. A infância dura até os 12 anos e a maioria das pessoas se pudessem voltar ao passado, escolheriam reviver essa fase.

            A adolescência por sua vez, é marcada por uma explosão de hormônios caindo como uma bomba em cima daquele ser que, de repente, se percebe num novo corpo, numa nova pessoa. Mudanças físicas e psíquicas acontecem em todas as direções afetando os relacionamentos sociais, afetivos em forma de crise que se prolonga até os 19 anos. Após essa etapa temos um indivíduo que está pronto para exercer o seu papel na sociedade, com o potencial para realizar-se profissional e afetivamente. É a fase mais propícia para as realizações e, para o bem ou para o mal, ela marcará toda a existência.

            A velhice, por sua vez, é a fase mais complicada.  Em um país onde a cultura e a mídia frequentemente enaltecem a beleza e a vitalidade da juventude, os idosos só são lembrados nos comerciais de venda de medicamentos. Programas de televisão, anúncios e até as redes sociais costumam apresentar como exemplos de velhice saudável, aquele idoso musculoso ou aquela velhinha animada saltando de paraquedas. Na verdade, esses estereótipos negam a velhice, pois, nas entrelinhas, estão defendendo que o idoso ideal nada mais é que um idoso travestido de jovem. Esse cenário resulta em uma deterioração não apenas da saúde física, mas também mental, levando a quadros de depressão e solidão.

            Para vivenciar positivamente essa fase é preciso incorporar de maneira radical a noção de autocuidado tanto no aspecto físico quanto no psíquico. Comece enquanto é jovem a comer alimentos saudáveis, praticar exercícios físicos, ler bons livros, ser útil, praticar a autocompaixão e a atenção plena (mindfulness). O filósofo e poeta Sêneca nos ensina: “Quando a velhice chegar, aceita-a, ama-a. Ela é abundante em prazeres se souberes amá-la. Os anos que vão gradualmente declinando estão entre os mais doces da vida de um homem. Mesmo quando tenhas alcançado o limite extremo dos anos, estes ainda reservam prazeres”

Romildo R. AlmeidaPsicólogo clínico

CRIANÇA FELIZ, SEM CELULAR – Os riscos dos Smartphones para crianças

Parece que o mundo finalmente está descobrindo algo que parecia claro, isto é, o uso indiscriminado de Smartphone por crianças e adolescentes é prejudicial ao seu desenvolvimento físico e mental. Quase um quarto dos países já proibiram os smartphones nas escolas e alguns estados brasileiros criaram restrições ao seu uso. É indiscutível que o emprego de tecnologias pode auxiliar no desempenho de tarefas escolares, porém o uso de celulares perdeu a sua função principal e está causando sérios problemas nas crianças. Queda do aprendizado, dificuldades de concentração, redução da interação social, insônia, depressão e ansiedade.        

Felizmente o debate que discute o banimento do uso do celular no ambiente escolar ganha corpo e alguns países já proíbem o seu uso. É o caso de França, Espanha Grécia, Dinamarca, Finlândia, Holanda, Itália e Suíça. No Brasil, o MEC (Ministério da Educação e Cultura) está trabalhando num projeto para proibir o uso de telefones celulares em sala de aula em todas as escolas, devendo ser anunciado brevemente.

            Menos celular mais qualidade. Estudos recentes realizados no Reino Unido mostram que a proibição dos celulares aumentou significativamente as notas dos alunos, especialmente entre aqueles que tinham menor desemprenho. No Japão e na Coreia do Sul, os celulares são preparados com tecnologia especial para serem usados somente para fins pedagógicos, não permitindo o acesso às redes sociais. Em matéria exibida na Folha de São Paulo em 07/09/2024, os próprios alunos da escola Martin Luther King, no Rio de Janeiro, relataram significativa melhora, tanto no desempenho, como no relacionamento social, depois que deixaram o celular.

            Proibição soa sempre como uma palavra pesada em relação à liberdade que a maioria das pessoas defende numa sociedade democrática. Mas no caso de crianças e adolescentes, o uso indiscriminado de tecnologias como smartphones, tem se tornado um assunto que envolve não só uma questão de desempenho escolar, mas sim, de saúde mental e física. Algo precisa ser feito com urgência e a mudança pode começar em casa com os adultos que são os modelos mais importantes.

Desconectando: Por que trocar a vida real que está se revelando à nossa frente por uma falsa experiência de mundo paralelo que a tela nos impõe? Evite o uso do celular na presença das crianças, priorize interações face a face e atividades que envolvam o mundo físico. Esteja sempre conectado, não com o celular, mas consigo mesmo e com o que acontece ao seu redor, afinal, essa é a única vida que importa: a vida real.

Romildo R. Almeida – Psicólogo clínico